quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Avós

Tratava-se de um espelho grande, bisotado, moldura dourada toda trabalhada. Dependurado em uma parede branca na casa da tia Zizinha, uma tia-avó, irmã mais velha de minha avó Maninha (aliás, de onde vêm tantos diminutivos nos nomes de nossas avós?).

Fato é que aquele espelho tinha sido de Mamãe Joaquina, como minha avó chamava sua própria avó que a criou até os 10 anos. Hoje, ainda viva e com 95 anos, ela no entanto nascera com uma saúde frágil. Quinta filha, não podia ter a devida atenção da mãe, tendo sido acolhida por Mamãe Joaquina.

Não sei porque, nem como, mas aos seus 80 e tantos aquele espelho na casa de tia Zizinha lhe saltou aos olhos. Como poderia estar lá se, por direito, deveria estar com ela que tivera a maior proximidade, o maior vínculo com Mamãe Joaquina?

Iniciou um processo com tia Zizinha, para convencê-la a lhe passar o espelho. Não foi difícil. O grande problema para a tia não era o espelho, a herança, a lembrança. Era a parede. Não poderia tirar o espelho e deixar vazia aquela parede toda branca. Ela pintava pratos, tinha pratos pendurados pela casa toda, mas para aquela parede não pareceu ser a solução.

Sem problemas. Minha avó resolveu então pintar um quadro - medidas pré-definidas - para trocar pelo espelho. Assim fez e levou o espelho para sua casa, enfim.

Muito pouco tempo depois, em uma limpeza, o espelho se quebrou. Mas não houve grandes dramas a respeito. Já se tinha cumprido o ciclo e, afinal, a memória continuou intacta.

Nunca vi este tal quadro que ela pintou, e ele já se perdeu na distribuição dos objetos quando tia Zizinha morreu. Mas fico pensando se não deveria tê-lo resgatado, pendurando-o em uma parede branca na minha casa, criando um novo ciclo para uma história que começou com a avó da minha avó.
Afinal, o que pode ser mais especial que a lembrança de nossas avós?

Nenhum comentário:

Postar um comentário